Continuando com o apresentado na parte I do artigo é primordial examinar as atitudes e influências do coach que vão transformar o encontro interpessoal em um processo de coaching eficaz, propósito principal desse artigo.
Desta maneira, são atitudes fundamentais do coach eficaz:
1 - Autoconhecimento e autodesenvolvimento contínuo:
O que constitui um real direito a ajudar, só poderia se basear na capacidade do coach de viver de maneira mais eficaz do que o cliente, pelo menos nos setores em que o cliente encontra os “problemas” e que o levam a solicitar ajuda. Espera-se maior eficácia do coach sobre a questão do cliente, do que esse possa manifestar em sua vida.
O coach deve estar (ele próprio) engajado em conquistar sua liberdade total, num processo constante de autoconhecimento, de desenvolvimento e de atualização de seu próprio potencial humano, ajudando eficazmente outras pessoas a alcançarem este desenvolvimento/aprendizagem. O coach eficaz deve, pois ser capaz de demonstrar que se estivesse nas mesmas condições que seu cliente, saberia se sair delas de maneira mais construtiva do que esse último.
Parte-se do princípio que a atitude continua de autoconhecimento e autodesenvolvimento do coach é a base sólida para sua própria eficácia pessoal, profissional e de ajuda. É necessário cuidar primeiro de si e de seu estado pessoal, antes de poder oferecer o melhor a seu cliente.
2 – Congruência:
Embora poucas pessoas tenham consciência disso, a maioria das mensagens que emitimos para os que nos rodeiam exprimem-se no modo não verbal de comunicação. Estamos em continuo estado de emissão, mesmo quando estamos totalmente silenciosos ou até mesmo quando dormimos. O catálogo não verbal é imenso e variado: gestos, olhares, suores, estremecimentos, tom de voz e mímicas diversas.
Somos incongruentes quando nossos dois modos de comunicação (verbal e não verbal) estão em desacordo, ou seja, quando dizemos uma coisa, e em contraposição nossa linguagem não verbal revela algo diferente, que transmite nosso verdadeiro pensamento. Nestes casos, a comunicação verbal concretizada através de palavras e sons torna-se ineficaz.
Pesquisas científicas demonstram a primazia de nosso sistema não-verbal de comunicação. Mediante tal exposição, fica fácil compreender a importância da congruência para uma relação de coaching eficaz, onde a congruência é fator primordial a construção da confiança.
3 - Reconhecer-se como um facilitador:
Muitas vezes o coach pode cair na armadilha de se considerar como o “salvador” do seu cliente, aquele que oferece a “solução” e até mesmo o cliente passa a crer nisso. Essa é uma atitude limitadora e negativa do processo de coaching.
Postula-se aqui que o desenvolvimento/aprendizagem do cliente se deve a presença de uma tendência a sua auto-realização e à atualização de suas próprias potencialidades, a atitude do coach se limita apenas a ser o facilitador do processo libertador do cliente tornando-o mais eficaz.
Comparando-se com o desenvolvimento físico onde cada organismo corporal se utiliza de seu meio ambiente para crescer e aumentar suas potencialidades, o mesmo ocorre no domínio psicológico, onde uma atitude facilitadora oferece condições favoráveis para o aumento, crescimento e se desenvolvimento psicológico do orientando segundo sua própria potencialidade. Assim, não se trata de minimizar a importância do coach para o crescimento e maturação do cliente mediante suas necessidades imediatas, trata-se antes de reconhecer a influência eficaz da atitude do coach como um facilitador desse processo, para o cliente, dotado de seu próprio potencial interior de desenvolvimento e auto-realização.
4 – Confiança no potencial humano do orientando:
A evolução de um ser humano surge de uma dupla fonte: o desenvolvimento dinâmico de suas próprias forças de crescimento e a interação destas forças de crescimento com seu meio ambiente.
O ser humano se organiza e se integra através de seu capital inato, de seu potencial parcialmente desenvolvido, tudo que a pessoa adquiriu pela aprendizagem em seus aspectos físicos, emotivos e intelectuais, suas capacidades, seus talentos, seus conhecimentos, suas lembranças, os comportamentos que aprendeu, suas atitudes, suas crenças, seus hábitos e tendências, baseados no passado e orientado para o futuro. Estes diversos elementos são integrados de maneira única e continuamente em mutação para cada pessoa.
A palavra confiar etimologicamente significa, con = juntos e fiar = dar crédito, partindo disso, para eu dar crédito preciso confiar em mim mesmo e no outro. Cabe ao coach eficaz a atitude de confiar no potencial humano de seu cliente, ajudando-o a encontrar dentro de si mesmo esse potencial e trazê-lo para fora. Assim, não é uma transferência do potencial do coach que mais ajuda, mas sim, o emergir do potencial do próprio cliente através da demonstração dessa confiança.
5 - Respeitar a individualidade e diversidades do ser:
Cada ser humano percebe a “realidade” a seu modo, através dos filtros de sua própria personalidade e de suas experiências anteriores. A “realidade” é essencialmente ambígua e somos nós que a interpretamos e lhe damos um sentido. O individuo experimenta, pois a “realidade” de modo essencialmente subjetivo, embora, espontaneamente, sejamos levados muitas vezes a atribuir às nossas percepções subjetivas um valor absoluto. Tudo se passa como se, para nós, nossa maneira de percebermos a nós mesmos e de percebermos o mundo que nos cerca fosse à única possível.
O respeito a essa individualidade e diversidade do ser por parte do coach exercem uma influência positiva sobre o desenvolvimento/aprendizagem do cliente, acolhendo a sua maneira de perceber e, portanto, de integrar o seu próprio mundo interior a seu meio ambiente.
6 – Ausência do juízo ou da avaliação:
Um grande obstáculo à relação de ajuda consiste na tendência de muitos coaches a avaliar e julgar seus orientandos. É importante constatar que a relação de coaching eficaz não implica em acordo, e nem em desacordo com as percepções do ocliente. Acordo ou desacordo só poderiam ser emitidos a partir de um juízo moral feito pelo coach, baseado em sua própria “realidade”. A avaliação ou o juízo moral são limitadores numa relação de coaching.
Quando nos postamos para compreender o mundo como o cliente o vê, não nos concentramos em julgá-lo ou apreciá-lo moralmente. O juízo tende a fechar o coach no seu quadro de referencia e a diminuir sua eficácia no processo de desenvolvimento/aprendizagem.
7 - Imediatez:
É a atitude para discutir aberta e diretamente com o cliente o que está ocorrendo no “aqui e agora” na relação interpessoal entre ambos: isso exige do coach, ter habilidades de atenção, escuta, empatia e assertividade. Através da imediatez o coach manifesta sua intuição sobre o que o cliente sente no encontro, o que permite detectar no “aqui e agora” o que está limitando a relação interpessoal, e ver de que modo se pode negociar. Isto supõe um clima de confiança e apoio, o que implica em juntar compreensão e assertividade. A imediatez remete a um encontro verdadeiro e profundo da relação de coaching eficaz.
8 - Compreensão empática:
A compreensão de que se trata aqui não se refere, em primeiro instância, ao que se poderia chamar de ”conteúdo” da comunicação. Trata-se de o coach ter a atitude de sair de si mesmo e de partilhar do mundo subjetivo de seu cliente. Quando o coach consegue, ainda que imperfeitamente, entender as emoções subjetivas do cliente, comunicadas mais ou menos claramente por esse ultimo sob o véu dos “conteúdos” objetivos, pode-se dizer que começa a compreendê-lo e ampliar a eficácia da relação de coaching.
9 – Escuta ativa:
Para entender totalmente o cliente, é preciso que o coach tenha uma atitude de escuta ativa. Isso significa que toda a sua atenção deve estar concentrada nas comunicações verbais e não verbais do cliente. O coach que quer compreender profundamente seu cliente deve resignar-se a calar exteriormente, mas, sobretudo interiormente. Deve se debruçar sobre o mundo do ocliente e desligar temporariamente seu próprio sistema de comunicação interior consigo mesmo, de seu diálogo interior. Não chegará ao silêncio interior completo, mas é importante que sua comunicação interna não interfira com a escuta do cliente, condição essencial que constitui o ponto de partida da comunicação interpessoal eficaz na relação de coaching.
10 - Amorosidade:
A maturidade de um coach eficaz reside na sua atitude de oferecer seu amor de modo desinteressado ao orientando. O amor dos outros e o dom de si, os indícios mais certos de maturidade humana, repousam, pois, sobre um amor de si verdadeiro: ninguém pode dar o que não tem.
Se a necessidade básica de amar e ser amado não é razoavelmente satisfeita, as atitudes do coach que favorecem o crescimento do cliente se acham limitadas em sua eficácia; ao contrário, numa atmosfera desse amor e de troca a influência positiva das outras atitudes apresentadas tornam-se sinergicamente mais eficazes na relação de coaching.
O desenvolvimento da tendência de atualizar os seus recursos interiores constitui para o ser humano a conquista de sua liberdade. Sentir-se amado de um amor não interessado, é sem dúvida alguma a condição mais importante para assegurar o seu desenvolvimento/aprendizagem. Esta condição afeta não somente o desenvolvimento emotivo do ser humano, mas igualmente seu desenvolvimento intelectual e mesmo físico, como o demonstraram as pesquisas de Harlow (1938) e de Spitz (1949).
O coach eficaz facilita o processo do cliente em se desenvolver/aprender harmoniosamente, ajudando-o não apenas a reagir ao seu meio ambiente e as suas situações “problemas” ou condições “limitantes”, mas também a aprender gradativamente a modificá-lo por sua ação própria de maneira proativa e ir em direção a seus objetivos. É uma maneira de ajudar o orientando a aprender a aprender.
Esta aprendizagem na relação de coaching é fortemente condicionada pela influência da atitude do coach como facilitador. Se o cliente estiver sujeito a atitudes desfavoráveis no encontro, feita de incongruência, falta de confiança, julgamento, incompreensão, falta de interesse, desrespeito, arrogância, rejeição e de desamor, as suas reações serão mais ou menos consagradas à defesa, deixando-lhe assim poucas formas para se realizar positivamente e se libertar. Ao contrário, em uma atmosfera de congruência, confiança, ausência de julgamento, compreensão, interesse, respeito, facilitação, aceitação e de amor, o cliente se torna capaz de utilizar seus recursos interiores para entrar em contato com a realidade, e aí encontrar matéria para o crescimento de seu ser e desenvolvimento/aprendizagem de sua total potencialidade em direção ao que quer.
Assim, cabe ao coach que busca uma relação de coaching realmente eficaz assumir a responsabilidade de desenvolver as atitudes que vão favorecer a si mesmo e especialmente ao cliente através de uma postura mais positiva frente ao mundo que o cerca, possibilitando um crescimento de suas faculdades internas expressas em desenvolvimento/aprendizagem física, psíquica, emocional e social e ampliação de sua mais completa liberdade.
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Autor do artigo: Flávio Souza
Formador de Coaches da International Coaching Community
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